Recuperação de Empresas

Baleia Boiando: Falência da SVB Ainda Oferece Risco à Bolsa Brasileira

No começo de março, em meio à entrega de estatuetas douradas para celebridades hollywoodianas, o mercado financeiro empalideceu ao avistar uma baleia boiando. Essa é a expressão usada no mercado para se referir a quebra de grandes empresas. 

E não foi uma baleia qualquer. O mamífero pertencia à casta seleta e poderosa dos bancos. Era natural da maior potência econômica e bélica da história. A sua crise representou a segunda maior falência no setor bancário dos EUA desde a histórica e traumática quebra do Lehman Brothers. Lembrança que provoca arrepios de quem foi atingido pelo furacão da crise de 2008.

Por isso, quando os investidores viram do convés a envergadura e extensão do animal inerte carregado pelas ondas do mar, foi um Deus que nos acuda. Em escala global. Sim, a quebra de um banco dos EUA pode provocar efeitos cascatas a repercutir no mundo inteiro, inclusive no Brasil.

Mas talvez esteja pensando. “Eduardo, isso foi em março. Estamos em junho. Se nada tivesse acontecido até agora, não seria alarmismo?”. Infelizmente não. 

Neste artigo pretendo explicar porque essa baixa no sistema financeiro estadunidense pode ainda gerar desdobramentos ruinosos, seja no Brasil, seja em qualquer lugar do mundo, apesar do tempo que já correu.

Não é apenas o Brasil que enfrenta situação delicada na economia há alguns anos. A economia global atravessa um período difícil e a perspectiva não é de melhora pujante a curto prazo. 

Por essa razão, é prudente se inteirar sobre o contexto que vivemos e as possíveis crises em gestação para nos prevenir e suportar a tormenta. 

Qual o nome da baleia?

Quem apareceu boiando na praia no começo de 2023 foi o Silicon Valley Bank (SVB). Até 8 de março de 2023, era o 16º maior banco dos EUA. Posição que foi seriamente comprometida quando anunciou um plano emergencial para levantar mais de US$ 2 bilhões para cobrir perdas com ativos financeiros. 

A notícia derreteu as ações da empresa em mais de 60%. Em apenas 2 dias, o SVB declarou falência. 

Sem dúvida a relevância desse player justifica o alvoroço, porém o que agrava o episódio é o de não se tratar de um caso isolado. A falência do SVB desponta em um momento que outros bancos, de menor porte, também quebraram por falta de liquidez há não muito tempo, são os casos do Signature Bank e Silvergate Capital

Para os analistas e observadores externos, a quebra de uma instituição da importância do SVB neste contexto indica mau agouro. A formação de uma tendência sombria a pairar no mercado financeiro e se alastrar mundo afora. Ou seja, crise. 

O fato de o Governo Joe Biden intervir no caso SVB demonstra a gravidade da situação. O Governo criou um fundo de US$ 25 bilhões dos recursos do tesouro para emprestar aos bancos e garantiu que todos os depósitos dos clientes SVB estão garantidos. 

A ação do governo claramente foi para evitar uma epidemia, pois outros bancos poderiam sofrer com ondas de saques de clientes em pânico. 

O que matou a baleia?

Curiosamente, o mesmo governo que agiu para acalmar a maré no sistema financeiro foi uma das causas para a ruína do SVB.

O banco entrou em colapso quando o Federal Reserve, o banco Central dos EUA, elevou a taxa de juros de 0,25% para 5% em período curto de tempo. Isto se deveu a alta da inflação. 

O efeito dessa medida foi causar volume alto e simultâneo de resgates de clientes do banco. Como o nome deixa sugerido, a principal carteira de clientes do SVB era de startups. Há pelo menos 4 décadas o banco era conhecido por fomentar esse perfil de negócio e se consolidou no mercado investindo forte neste segmento.

Ocorre que o setor já enfrentava dificuldades com o estouro de uma bolha que gerou onda de demissões em massa e crescimento desacelerado. Com a elevação dos juros, a situação piorou, pois a paciência dos investidores diminuiu. Muitos não se mostraram dispostos a aguardar o tempo médio estimado para o retorno financeiro de uma startup, cerca de 5 anos, e anteciparam o resgate. 

As startups precisam queimar caixa para honrar os compromissos e tiveram que recorrer aos depósitos bancários para se manter operantes. Contribuiu para esse movimento a restrição do crédito fácil em razão do aumento dos juros. A alta dificultou o acesso de empresas não lucrativas ou inseridas em setores com baixa regulamentação, caso das startups, a financiamentos. 

Contexto que influenciou volume exacerbado de resgates e erradicou a liquidez do SVB. 

Complicou ainda o fato da SVB ter precisado vender ativos financeiros do portfólio para atender a demanda por resgates. Apesar de muitos deles se tratarem de títulos públicos, a marcação a mercado gerou prejuízos calamitosos. 

Quais são os riscos que a quebra do SVB oferece ao sistema bancário brasileiro?

A quebra de um grande player do mercado do centro do capitalismo sem dúvida potencializa efeitos cascatas perigosos na economia global. O Brasil, naturalmente, não fica isento de risco. 

Veja os principais problemas que a queda do SVB pode causar. 

Risco epidêmico

A quebra do SVB pode levar outras empresas à falência ao aumentar a desconfiança de clientes de bancos menores, por exemplo. O receio difundido no mercado é capaz de estimular o resgate massivo de depósitos e gerar problemas de liquidez. 

As startups dependentes dos investimentos desses bancos também serão afetadas e podem entrar em colapso para manter as operações. 

Falência de startups nacionais

Segundo a Bloomberg Línea, o SVB tinha mais de US$ 10 milhões investidos por startups brasileiras. O Federal Deposit Insurance Corporation (FIDC) dos EUA se comprometeu a ressarcir de imediato clientes do SVB em até US$ 250 mil. Valores acima da quantia deverão ser quitados em futuro não especificado. 

Ou seja, as startups nacionais precisarão se virar para manter suas atividades até o pagamento dos US$ 9,75 milhões faltantes. Todas terão resiliência até lá? A torcida é que sim, mas podemos estar na contagem regressiva de uma bomba relógio. 

O pior ocorrendo, as receitas das startups despencaram com suas ações na bolsa

Crédito curto

As instituições financeiras tendem a dificultar o acesso a fontes de financiamento de empresas com dificuldade de caixa. Perfil de negócios não escolhido à toa, pois se trata do mesmo perfil de clientes do banco mais recente a naufragar. 

Como diz o ditado, cautela e canja…

Demissões em massa

Empresas em dificuldade de caixa e com crédito restrito na praça, tendem a seguir qual caminho para sobreviver? A enxugar gastos, a cortar na carne, a demitir quem não for indispensável. 

Cenário que também favorece o endividamento e a contração da economia em seu contexto geral.

Por enquanto, o cenário parece de calmaria, de poeira baixando. Mas isso talvez seja apenas mera impressão. Nas camadas submersas e ainda não alcançáveis por canais difusores pode estar em andamento uma crise vulcânica em processo de erupção. A torcida, obviamente, é que tal possibilidade não vingue e que desfrutemos de dias mansos e prósperos. Mas é prudente ficar de olhos bem abertos.

Autor: Eduardo Almeida

Especialista em reestruturação empresarial, reconhecido como "doutor das empresas", com foco em salvar instituições de saúde em crise no Nordeste através de diagnósticos precisos e intervenções estratégicas eficazes.

Data:

31 maio, 2023

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