Quem pediu recuperação judicial não foi a Starbucks dos EUA, a matriz. Esta, até onde se sabe, continua sólida, produzindo e vendendo milhares de cafés aromados e fumegantes ao redor do mundo.
A empresa que acusou o golpe e pediu tempo para o juiz foi a SouthRock, empresa que detém o direito de operar no Brasil com a bandeira Starbucks. Um dos motivos, a propósito, para o pedido de recuperação judicial foi o de evitar a perda do direito de uso da imagem da marca. A matriz da cafeteria declarou lidar com problemas no pagamento dos royalties.
Além da Starbucks, a SouthRock trabalha sob as bandeiras Subway e Eataly. Todas com risco de encerrar as operações no Brasil, mas seguem inabaláveis em seus países sedes.
Parada técnica
A SouthRock entrou com pedido de recuperação judicial alegando inadimplência de R$ 1,8 bilhão. Na última segunda-feira (6/11), ela apresentou uma lista de credores à 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo. Na lista que se espraia por mais de 150 páginas, há notável diversidade de instituições.
Além da matriz mundial da Starbucks, cuja dívida é do montante de R$ 49 milhões, há empresas como a Votorantim. Mas o grupo que mais se destaca são as instituições financeiras. Bradesco, Santander, Banco do Brasil, a lista é longa e inclui até a Receita Federal.
A diversidade de credores mostra que a crise que a empresa atravessa é longa e várias tentativas foram feitas para retomar o eixo e a iniciativa na peleja. Todas, contudo, nocauteadas pela envergadura das adversidades.
Radiografia da crise
No plano apresentado na Vara de falências de São Paulo, a SouthRock expôs quais foram os principais entraves que implodiram sua estabilidade e a arremessaram para o redemoinho da crise.
Um trauma ainda presente
A pandemia da covid-19 é uma causa constante apresentada pelas empresas que recorreram à recuperação judicial em 2023.
Não podia ser diferente diante de um evento tão trágico, universal, inesperado e impactante.
A exemplo de boa parte dos negócios que entraram na espiral da crise em 2023, a pandemia foi uma das causas para a explosão do endividamento.
Não que a situação antes estivesse estável. O país atravessava uma longa crise antes da pandemia. Mas a necessidade de fechar as portas e a restrição da circulação de pessoas, forçou as empresas que trabalham diretamente com o público a recorrer a linhas de crédito e postergar investimentos.
Mesmo contando com condições especiais de crédito e dilatação de prazos, a extensão da crise e a recuperação econômica tímida minaram os efeitos de tais medidas.
Custo Brasil
Outro problema apontado pela gestão da SouthRock foi o elevado custo de vida no Brasil proporcionado por inflação ampla e renitente.
O custo de vida elevou-se e permanece nas alturas, corroendo o poder de consumo da população. Cenário que estimula o consumidor a ser mais cioso em relação aos seus gastos e dar preferência para itens básicos e mais acessíveis de consumo.
A crise certamente é mais vigorosa e abrasiva nas classes populares, mas também abarca a classe média e a classe média-alta, que se vê obrigada a alterar padrões de comportamento para equilibrar as finanças. Isso certamente refletiu no consumo e impactou todas as redes que miram esses extratos sociais.
Outro aspecto que contribuiu para o aprofundamento da crise foi a intensificação da concorrência com a massificação de aplicativos de entrega. A necessidade de manter o valor de marca atrelado às despesas concernentes ao frete reduziu a competitividade dos produtos da empresa, que passou a disputar espaço com produtos mais populares.
Graúdos e congelados
Robustece o cenário da crise a manutenção de elevada taxa de juros por parte do Banco Central Brasileiro. Um dos principais fatores para a restrição de crédito no mercado, condição que restringe as possibilidades de pagamento e inibe o reaquecimento do mercado interno.
A conjuntura internacional ainda sob efeito da paralisação pandêmica e dos conflitos bélicos de larga escala são as causas para a precaução. O futuro é incerto.
Os juros nos últimos meses reduziram, mas o descenso foi tímido e vagaroso e não há no momento sinais de que essa postura venha a se alterar nos próximos meses.
Pedido negado
O pedido de recuperação judicial da SouthRock foi negado pelo juiz Leonardo Fernandes dos Santos da 1ª Vara de Falências de São Paulo. Na decisão, o magistrado avaliou faltar elementos técnicos que justifiquem o pedido e solicitou perícia preliminar na documentação da SouthRock.
Santos nomeou a Laspro Consultores para conduzir a perícia e deu o prazo de sete dias para a empresa divulgar os resultados preliminares. Prazo prestes a expirar.
Por decorrência da decisão, a SouthRock apresentou a 1º Vara de Falências na última segunda-feira (6/11) a lista de credores com mais de 150 páginas.
Os efeitos da recuperação judicial
Com a aprovação judicial, a SouthRock poderá contar com um período de blindagem das cobranças das dívidas que contraiu até a solicitação do pedido de recuperação.
O recurso é uma medida empregada para ampliar as condições de recuperação de empresas em crise para evitar falências e danos à economia.
No entanto, a organização amparada pela recuperação judicial precisa seguir à risca o plano apresentado e aprovado pela justiça, além de prestar contas periodicamente. Caso não siga as determinações documentadas ou mostre desempenho aquém do esperado, a recuperação judicial é extinta e a falência, decretada.